No ano passado, a designer gráfico Carol Rossetti pensou num projeto em que pudesse extravasar sua criatividade. A mineira, de 27 anos, não tinha exatamente um plano. Queria apenas desenhar para criar seu próprio portfólio, como um desafio para si mesma. No primeiro desenho, sentiu que várias pessoas haviam se identificado, e resolveu falar sobre essas mulheres para o mundo. O resultado foi uma página de sucesso no Facebook com mais de 270 mil fãs e ilustrações com mulheres diversas, que foram traduzidas para mais de 15 idiomas e viraram o fantástico livro ‘Mulheres – Retratos de respeito, amor-próprio, direitos e dignidade’.

A primeira personagem da Carol foi a Marina. Assim como eu -e a maioria das mulheres que acompanham o blog-, Marina é gorda e é pressionada pela ditadura da moda com aquelas regras toscas que pouco a pouco vamos quebrando.

Bati um papo com a Carol sobre esse projeto super bacana que acabou virando livro, dá só uma olhada:

Da rua pra lua: O que te motivou a fazer essas ilustrações que tocam tanto nas feridas das opressões sofridas por mulheres?

Carol Rossetti: No início do ano passado eu fiz um desafio pra mim mesma, de publicar um desenho por dia na minha página no Facebook, para eu praticar. Eu sempre gostei de desenhar mulheres, vinha estudando feminismo. Eu criei a Marina, ia ser só ela, eu não faria mais. De repente, vi um monte de compartilhamentos, e aí comecei a fazer todas do mesmo tipo. O projeto foi se desenvolvendo dessa forma, ele não foi exatamente planejado pra ser assim. A partir disso o crescimento da página foi muito rápido, e eu fiquei muito feliz quando a Sextante me procurou para transformar esse projeto em um livro.

DRPL: Você é branca, magra, heterossexual, e que fala de algumas opressões vividas por mulheres com características completamente diferentes das suas. Como é falar para uma diversidade tão grande de gente? Qual é o segredo

CR: Eu fico muito feliz. Na verdade, essa interação de falar  de um grupo a qual você não necessariamente pertence, quando é feito com respeito e bom senso não tem problema. Eu não estou falando na posição de uma mulher gorda, eu falo como uma amiga de mulher gorda. As personagens geralmente são fictícias, mas as histórias são reais. Eu escuto o que as mulheres tem a dizer, reproduzo aquilo, e dou uma opinião minha, com muito respeito. Eu tenho cuidado pra não tomar as dores das pessoas como se fossem minhas, como se eu tivesse vivência daquilo.

DRPL: Uma coisa que cativa na sua arte é esse tom de aconselhamento, de compreensão da selva que é esse mundão cheio de preconceitos. Como você viu que as pessoas precisavam disso, desse tipo de carinho?

CR: O meu objetivo nunca é um conselho, propriamente, tem algo nessa palavra que me incomoda. É a aceitação, se aceite, eu te aceito, o mundo precisa te aceitar. Eu tento passar um pouco disso. Como no início só meus amigos curtiam a página, era tudo meio que direcionado pra eles, então acaba saindo num tom mais íntimo, e, talvez de conselho.

DRPL: Como funciona seu processo de criação? Você busca inspirações no seu dia a dia, ou costuma usar ideias vindas através das redes sociais?

CR: É um pouco dos dois. No início era só sobre coisas que eu presenciava, mas depois eu comecei a receber sugestões com questões que eu nunca tinha pensado, que são realmente muito fora do meu cotidiano, o que também colaborou pro crescimento do projeto. Eu ouço as sugestões e pesquiso na internet o que as pessoas estão falando sobre aquelas questões, vou atrás das histórias. Primeiro eu faço os textos, depois as imagens. E eu sempre me preocupo em não seguir um padrão de mulheres, tento ser o mais aleatória possível.

DRPL: Mesmo dentro do feminismo ainda vemos muitas mulheres resistindo em rever seus privilégios. Diariamente tem mulher negra, gorda, pobre, trans, lésbica, etc, mostrando as opressões constantes que sofrem. Como você vê a necessidade desse recorte dentro do movimento?

CR: Reconhecer os próprios privilégios não é um processo fácil, nem confortável. Exige necessariamente você perceber que em alguns momentos foi babaca. existe resistência, porque a gente não quer admitir que errou. Ao mesmo tempo, é um processo muito necessário, importante e libertador. Nós precisamos entender que é fundamental abrir os olhos e ouvidos para outras vivências. Fazer o recorte é um processo de aprendizado que no princípio é doloroso, mas no fim é algo muito gratificante, então todos precisamos passar por isso.

Curtiu? Para as manas do Rio, na próxima segunda-feira, dia 07, às 14h a Carol estará no stand da Editora Sextante na Bienal do Rio autografando o livro ‘Mulheres – Retratos de respeito, amor-próprio, direitos e dignidade’. O livro estará a venda lá, claro, mas você pode encontrar também nas melhores livrarias!

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