Já falei aqui sobre gente aleatória achando que pode dar pitaco na saúde alheia, mas hoje, como dizem, o buraco é mais embaixo. Hoje o papo é sobre gordofobia vindo de quem, em teoria deveria acolher e cuidar da gente: os médicos.

Já perdi as contas de quantas vezes a minha ida ao médico foi resumida em: se você não quer emagrecer, não vou poder te ajudar em nada. A negligência de alguns médicos comigo chegou ao ponto de uma otorrinolaringologista me “pré-indicar” uma bariátrica, pra resolver um problema de ronco noturno. É mole?

Sim, a OMS diz que obesidade é doença. A mesma OMS que considerava homossexualidade uma doença até – pasmem – 1990. A grande questão é: se obesidade é doença, quais seriam os sintomas? Porque o único “sintoma” claro da obesidade é ser gordo. Não bastando a medicina simplesmente se calar sobre essa questão, ainda colocam a obesidade como fator de risco para vários problemas de saúde. É tão difícil assim perceber que o sedentarismo é a chave de tudo, e que nem sempre ser gordo é sinal de ser sedentário? Fico espantada, em cinco anos de faculdade e mais alguns de residência ninguém tem sequer um tempinho pra debater o sedentarismo, e como ele afeta pessoas de diferentes estruturas corporais?

Meu clínico antigo (um senhorzinho fumante e claramente estressado) há 3 anos, quando eu o procurei devido à uma dor de cabeça constante, dizia que se eu não emagrecesse com urgência, em pouco tempo desenvolveria diabetes, hipertensão, problemas nas articulações. Ele não perguntou como era a minha alimentação ou meu estilo de vida. Por ser gorda, ele presumiu que possuo hábitos não saudáveis. Antes de passar qualquer exame, ele já tinha o diagnóstico: eu precisaria emagrecer. Estou chegando aos 30 com um total de ZERO problemas de saúde, obrigada. A dor de cabeça passou após eu trocar de emprego.

Há alguns meses, tive um sangramento bizarro. Nada explicava, mas em cada consultório ou emergência que eu precisei entrar, o diagnóstico era o mesmo: você precisa perder peso. Um remédio controlou o sangramento, mas me foi pedida uma bateria de exames. Fiz exame do sono, exames ginecológicos e estava tudo normal, até que o exame de sangue acusou uma anemia e uma resistência insulínica. A médica, mais uma vez sem me perguntar sobre a minha alimentação, decretou: Você precisa parar de comer besteira.

Me encaminhou para a endócrino, que pediu mais uns exames e disse: “com certeza isso é diabetes”, vou te encaminhar pra nutricionista e vamos acompanhar seu emagrecimento com reeducação alimentar. Caso não tenhamos sucesso, vamos para os remédios, e, em última instância, a bariátrica. Exames feitos, shazam: o exame não acusou nem pré-diabetes, mas sim um princípio de intolerância ao glúten. Nada que uma boa nutricionista – não-gordofóbica, falarei dela em outro post!- não tenha resolvido.

Com o tratamento – ou a negação dele – dos médicos dado às pessoas gordas, fica muito difícil não acreditar em negligência, que possa resultar muitas vezes na morte dessas pessoas. A conta do óbito, lógico, não vai pra gordofobia do médico. Vai pra obesidade, “o mal do século”. Se a minha casca não fosse tão grossa com atendimento médico negligente, eu teria sucumbido ao emagrecimento, mas teria continuado doente.

Sem mencionar o alto índice de indicação equivocada para a cirurgia bariátrica – tive indicações vindas de otorrinolaringologista e de ginecologista, risos nervosos- , que pode até “emagrecer alguém”, mas por muitas vezes faz com que as pessoas fiquem dependentes de suplementos vitamínicos para o resto da vida, além de desenvolver outros problemas sérios na saúde do operado.

Meu conselho é sempre ouvir mais de uma opinião médica, sempre pedir exames antes de aceitar qualquer diagnóstico, e sempre questionar tratamentos e remédios invasivos demais. Sei que muitas vezes os médicos não estão acostumados a lidar com questionamentos de pacientes, mas, só assim vão perceber que nós não vamos mais deixar passar gordofobia dentro de consultórios.

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